CONTRATO DE FRANQUIA: O PREJUÍZO POR SI SÓ NÃO PODE SER ATRIBUÍDO AO FRANQUEADOR. ENTENDA O PORQUÊ!
O contrato de franquia é celebrado para perdurar por anos, de forma que o empresário que deseja se tornar franqueado de uma rede não pode se precipitar no fechamento do negócio.
O interessado em obter uma franquia deve, antes de fechar o tão sonhado negócio, solicitar uma cópia da Circular de Oferta de Franquia (COF), do pré-contrato (se existente) e do contrato de franquia, documentos esses que por força de lei devem ser facilitados pelo franqueador, e efetuar cuidadosa leitura desta documentação, contando, se possível, com o auxílio de um profissional, preferencialmente, especializado no setor de franchising que lhe ajudará a: (a) sanar eventuais dúvidas; (b) antever os seus direitos e obrigações contratuais e legais; e (c) exigir que todas as promessas que lhe forem feitas pelo franqueador nas negociações, ou seja, na fase pré-contratual, sejam também formalizadas por escrito.
Mas não é só, há outras precauções básicas que necessitam ser tomadas pelo candidato a franqueado, a saber:
(1) Não se deixar levar pela primeira impressão nem por aparente “prestígio” do franqueador;
(2) Comprar um guia de franquias, e consultar a Associação Brasileira de Franchising (ABF) e outros portais na internet sobre franquias;
(3) Avaliar a solidez da marca que lhe será franqueada;
(4) Ter em mente que as etiquetas, certificados, selos de excelência e/ou outros títulos obtidos pelo franqueador não garantem nada;
(5) Ter dinheiro de sobra e tomar cuidado com as taxas cobradas pelo franqueador, uma vez que para evitar contratempos deve haver prévia avaliação do total de capital disponível para investir no negócio e de todas as taxas decorrentes do sistema de franquia desejado (geralmente: taxa inicial de franquia, royalties e fundo de publicidade), recomendando-se que se invista inicialmente até 50% (cinquenta por cento) do valor total de recursos disponíveis, uma vez que, logo que iniciadas as atividades comerciais, surgirá a necessidade de uma sobra (capital de giro) para conseguir sustentar o negócio enquanto este não se consolida financeiramente;
(6) Escolher bem o ponto comercial onde o negócio se desenvolverá;
(7) Seguir a Legislação (Lei de Franquia 8.955/94 e Código Civil) e toda a Documentação fornecida pelo franqueador;
(8) Fazer sempre um “plano de negócio”, pois, além de uma relação de franquia nascer como já dito para perdurar por anos, não bastará montar o negócio, será preciso participar ativamente deste, já que o franqueador não fará tudo, e atentar-se ao fato de que não é qualquer pessoa que tem perfil para se tornar franqueado;
(9) Verificar se há relação de efetiva “parceria” com o franqueador; e
(10) Procurar preferencialmente um ramo que tenha afinidade.
E tudo isso, porque a relação de franquia caracteriza-se como um contrato empresarial que possui os riscos inerentes à modalidade, não havendo a garantia de que o negócio franqueado será realmente rentável e próspero, dependendo o sucesso deste dos mais variados fatores, tal como a necessidade do mercado, a localização do ponto comercial, a situação econômica do país e da região explorada e, principalmente, a administração do franqueado, uma vez que no sistema de franchising há entre as partes total independência administrativa e financeira.
A unidade franqueada não é uma filial ou sucursal da franqueadora, não há vínculo societário e empregatício entre as partes contratantes, tratando-se de uma relação entre empresários autônomos, de tal modo que se pode afirmar com todas as letras que “o contrato de franquia não constitui nenhuma garantia de sucesso e rentabilidade, cabendo ao franqueado via de regra suportar os prejuízos advindos do negócio“.
Mais do que isso, como tal relação contratual se dá, repita-se, entre empresários autônomos, não há que se falar em relação de consumo, tanto que o franqueado comercializa os produtos e/ou serviços que recebe do franqueador a fim de obter lucro, revelando que estes mesmos produtos e/ou serviços são o cerne da atividade econômica explorada e têm como destinatário final exclusivamente os consumidores do negócio franqueado, regulando-se, assim, a avença de franquia por uma legislação própria, qual seja, a Lei nº 8.955/94 e, suplementarmente no que esta for omissa, pelo Código Civil.
Como se pode perceber, o contrato de franquia visa, em tese, proporcionar vantagens para ambas as partes contratantes, ao franqueador que consegue ampliar a oferta dos seus produtos ou serviços no mercado, sem que seja necessário instalar filiais do seu estabelecimento para que tal resultado seja alcançado, e ao franqueado que ingressa em um ramo de atividade, geralmente, já sólido no mercado e conhecido dos consumidores, cabendo-lhe administrar bem o seu negócio.
Contudo, é óbvio que para que seja possível colher todos estes frutos, o contrato de franquia deve, por outro lado, possuir cláusulas detalhadas e claras sobre o negócio entabulado e aos direitos e deveres das partes contratantes, bem como espelhar a Circular de Oferta de Franquia (COF) entregue anteriormente ao franqueado, quando este ainda era mero candidato.
Em outros termos, as informações primordiais sobre todos os aspectos que envolvem a atividade empresarial de franquia a ser desempenhada devem estar explícitas na avença, assim como os valores e percentuais necessários para a adesão à rede de franquia, o valor do investimento inicial e dos gastos com propaganda, treinamentos e material de apoio e a forma como será dado o suporte ao franqueado no decorrer da relação contratual.
Presentes tais características na relação de franquia desenvolvida, é correto dizer que o prejuízo “por si só” não pode ser atribuído ao franqueador.
Apenas o prejuízo não serve de fundamento para responsabilizar o franqueador pelo insucesso do negócio franqueado. Para que o franqueador seja responsabilizado há a necessidade de se comprovar: (a) a prática por parte deste de ato ilícito, de abuso, ou de descumprimento do contrato de franquia celebrado entre as partes; e (b) o nexo de causalidade entre a conduta lesiva por este praticada e o resultado negativo proporcionado ao negócio franqueado.
E não há como ser de outro modo, pois, diferentemente do que muitos empresários pensam, o franqueado não está desincumbido “do ônus de provar a verdade dos fatos que atribui ao franqueador”, ou seja, o franqueado tem de “necessariamente convencer o juiz da sua verdade“, já que “o juiz julga sobre questões de fato com base no que é aduzido pelas partes e efetivamente provado no processo“.
Nesse sentido, posicionam-se os Tribunais pátrios, conforme se pode deduzir dos recentes julgados que seguem adiante:
Apelação nº 1095436-09.2013.8.26.0100, julgada pela1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça de São Paulo. O julgamento foi realizado em 11 de março de 2015 e teve a participação dos Exmos. Desembargadores Fortes Barbosa (Relator). Claudio Godoy e Pereira Calças;
Apelação Cível nº 2012.070971-0, oriunda da Comarca de Joinville, Florianópolis, e julgada pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina, em 17 de março de 2015, que teve como Desembargador Relator Luiz Fernando Boller;
Apelação Cível nº 2012.072865-5, oriunda da Comarca de Joinville, Florianópolis, e julgada pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina, em 27 de janeiro de 2015, que teve como Desembargador Relator Altamiro de Oliveira; e
Apelação nº 0201464-23.2010.8.26.0100, oriunda da Comarca de São Paulo julgada pela 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça de São Paulo. O julgamento foi realizado em 10 de abril de 2015 e teve a participação dos Exmos. Desembargadores José Reynaldo (Presidente), Ricardo Negrão e Araldo Telles (Relator).
Com efeito, ausente a comprovação da culpa exclusiva do franqueador pelo insucesso do negócio franqueado, não há como responsabilizá-lo pelo prejuízo oriundo deste resultado negativo, o qual deverá ser suportado pelo franqueado.
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Daniel Dezontini, advogado e sócio fundador do escritório Dezontini Sociedade de Advogados, pós-graduado na área de direito processual civil pela PUC/SP, especialista em direito contratual pelo Centro de Extensão Universitário (CEU) e ampla experiência na área de franchising e locações.